Reciclando uma frase de um velho filme da moda, ninguém pode te explicar quem ou que dêmonios é Jandek – você tem que ouvir por conta própria.
Ao pé da letra, Jandek é o pseudônimo do músico Sterling Smith, um recluso texano que desde 1978 lança discos de música estranha e empenada sem dar entrevistas, fazer shows ou sequer se deixar fotografar. Para se ter uma ideia (bem vaga, por sinal) do que é a música de Jandek, pense numa mistura de folk, country, blues, punk e noise executada por alguém que está descobrindo como tocar no ato da gravação. O jornalista Luciano Cirne, ao contar um causo pessoal sobre Jandek no site Pop Fantasma, o definiu como “o Damião Experiênça ianque”. Ou seja, não é pra todos os gostos, mas quem se der ao trabalho pode descobrir muita coisa interessante – e surpreendente – nesse buraco de minhoca.

Por mais de trinta anos Jandek assombrou o underground americano. Os discos continuavam saindo, às vezes no ritmo de dois ou três por ano, e ninguém sabia de onde nem por quem vinham. A única pista era o selo que editava os álbuns – uma tal Corwood Industries, cujo endereço vinha impresso na contracapa para que os ouvintes pudessem “solicitar catálogo”. Que aliás, só tinha discos do próprio Jandek.
Em 2003, saiu o documentário Jandek On Corwood que tenta investigar o que há por trás da lenda por meio de entrevistas com jornalistas, donos de lojas de discos, DJs, fãs e colecionadores. O filme, que recentemente subiu na íntegra no YouTube, é o ponto de entrada perfeito para quem quer desbravar todo um novo continente de música estranha.
Entre causos & teorias (um sujeito garante que o artista é paciente de um hospital psiquiátrico, outro questiona se a pronúncia correta é “Yandek” ou “Jandek”), o filme propõe uma discussão interessante sobre a noção do que é música “boa” ou “acessível”. Qual é o valor da técnica e os limites da música experimental? Existe um jeito “certo” de fazer música? Música feia pode trazer sentimentos bonitos? Assista e descubra.
Em tempo: Jandek on Corwood não “resolve” o mistério de Jandek, até porque nem era essa a intenção. Na verdade, o próprio artista se encarregaria disso. Pouco tempo depois do filme sair, Jandek também saiu – de casa, no caso. E assim começou uma nova fase da carreira, marcada por aparições surpresa e colaborações inusitadas com outros tortos como Thurston Moore (Sonic Youth), Bradford Cox (Deerhunter, Atlas Sound) ou bandas anônimas de funk rock.
Para saber mais sobre essa fase do bardo empenado, recomendo esse artigo da Pitchfork que lista as “10 melhores aparições” de Jandek, com vídeos para provar. E sim, ele continua lançando discos até hoje. Já são mais de 150 discos e DVDs sem sinal de parar.
Aperte o play, boa noite & boa viagem.