Entrevistão: In Venus

Foto: Filipa Aurélio

Esses dias veio à tona um papo sobre o tal jornalismo musical, um campo sem começo ou fim. Muito disso pela enxurada de lançamentos nas plataformas de streaming que tornam o filtro mais necessário a cada dia. Esse filtro foi que me levou a In Venus e seu mais novo lançamento. Já conhecia a banda e o primeiro disco, Ruína (2017). Bem como a participação na coletânea De Profundis o single e o EP lançados pela banda. O crescimento da banda é facilmente perceptível ao longo dos anos e dos lançamentos. E a inquietude que sempre leva a um lugar novo. O pós-punk do passado hoje é um experimental que pode ainda ter um fio lá atrás, mas aponta para um futuro sem amarras. E um futuro que também leva ao passado e a bandas que foram décadas atrás pioneiras e até hoje continuam sendo vanguarda e influência.

Batemos um papo com Cint Murphy (voz e sintetizadores), Duda Jiu (bateria), Patricia Saltara (baixo) e Rodrigo Lima (guitarra). Em tempos que a juventude curte cada vez mais uma dancinha sem conteúdo, foi bom bater esse papo e, esperamos, será para você também entrar no universo da banda. Sintoma é um disco protesto. Um disco retrato. Um disco documental. Em 10 músicas a banda viaja por saúde mental, problemas crônicos sociais (crescentes) como a fome, passando por violência e pela necessidade de nãos e calar e nem baixar a cabeça. Sintoma teve produção e mixagem de Mari Crestani e Malka Julieta, respectivamente. Foi lançado virtualmente e em vinil pelos selos No Gods No Masters e Efusiva.

Ouça Sintoma a seguir via Bandcamp e leia o papo:

O Inimigo – Vamos começar pelo processo de feitura do disco. São 4 anos entre um disco e outro e muita coisa acontece num período desse. Os discos são bem distintos. Pelo que se convém chamar de pós-punk o primeiro cai certinho, e o segundo é um caldeirão de influências. O que levou a isso?

Cint Murphy: Inquietação. Quando lançamos o Ruína, tínhamos uma outra formação de banda e outras vontades estéticas nos embalavam naquele momento. Cantávamos em inglês com muitos efeitos, usávamos muitas camadas para, de certa forma, esconder um pouco o que realmente pensávamos. Eu sou muito grata em ter feito o Ruína no momento que foi, da forma como foi, trouxe muitos ensinamentos. Depois do Ruína, lançamos um EP chamado Refluxo, no qual já cantava em português e já havíamos mudado um pouco a nossa abordagem sonora, ali já dava para perceber algo mais dançante e uma estética menos etérea, mas ainda bem clássica. No Refluxo eu já não andava mais satisfeita com a abordagem clássica do pós-punk e comecei a trazer outras referências pra gente discutir. No começo de 2019 (Duda) Jiu entrou na banda e foi a nossa deixa pra fazer algo diferente. Jiu tem um estilo muito diferente da antiga baterista, e sentimos que deveríamos apostar mais em algo que nos tirasse da zona de conforto. Sentíamos que precisávamos ser ouvides, pois nossa mensagem é muito papo reto e não combinava muito com a estética anterior, daí começamos a compor, a princípio fizemos uma música chamada “Enxurrada”, que entrou numa coletânea chamada De Profundis. Essa é uma música que eu gosto muito, mas ainda não era aquilo. Quando começamos a compor o Sintoma identificamos em conjunto que mudar era preciso e assim fomos construindo as ideias, trazendo referências diferentes, que não eram necessariamente um post punk clássico (ou seja juntou minha vontade de mudar com a habilidade de Jiu, combinação explosiva). (Risos)

Rodrigo Lima: Acho que é bem isso que a Cint respondeu e tem duas questões a mais que eu acho que são interessantes de serem citadas (muito pelo meu entendimento). Sendo uma o fato de buscarmos por referências estéticas que foram para além de músicas ou bandas, extrapolando em paisagens, territórios, sensações particulares e que se transformavam quando estávamos/estamos em conjunto. E a outra foi o fato de termos tempo/espaço para experimentarmos sem a pressão de poucos horários de ensaio em estúdios. Diferente do outro disco e do EP (e até de todas outras experiências que tive com bandas), para o Sintoma nós ensaiávamos e ficávamos juntes por longos períodos de tempo, algumas vezes passando quase o final de semana inteiro no estúdio da Associação Cecília e isso foi algo que possibilitou mais experimentações e até a sensação de poder extrapolar a forma de lidar com a nossa música.

Patrícia Saltara: Foi tudo isso que Cint e Ro falaram, quero só enfatizar que ter tido tempo para construir esse disco foi fundamental, a escolha do local pra ensaiar, e nossas renúncias para encontrarmos tempo para ensaiar sem pressa, várias horas seguidas, todo fim de semana (e geralmente mais um dia na semana também)… Eu nunca tinha feito isso com nenhuma banda que toquei antes e digo que vale muito a pena. Tempo pra praticar, testar coisa diferentes, criar, discutir as letras, e entrar em uma sintonia única de convivência e de finalidade. Foi cansativo e maravilhoso ao mesmo tempo.

Duda Jiu: Da minha parte, sinto que o próprio desejo de investigar outras possibilidades sonoras e até mesmo imagéticas nos levaram ao resultado do álbum Sintoma. Primeiro porque a banda já havia apresentado resultados mais consistentes do post punk e a vontade de experimento é algo em comum a nós. A banda passou por processos de mudança desde a entrada de Patricia e consequentemente quando assumi a bateria nada mais poderia ser como era antes e então abrimos a porteira pra esse novo universo que se desenhou para nós.

Esse disco começou a ser feito então em 2019. Já no meio desse turbilhão que seguimos vivendo. Nossos problemas são os mesmos há muito tempo. Mas pioraram a olhos vistos. Até que ponto isso interferiu na obra?

Cint: Compusemos Sintoma ao longo de 2019 e gravamos em 2020, dias antes da pandemia começar. Parecia que estávamos prevendo um apocalipse quando pensamos nas letras e no manifesto, mas a realidade é que o apocalipse já está acontecendo há anos, então não teve muita previsão, o que fizemos foi só envelopar o que já estava acontecendo. O que rolou depois foi uma confirmação de tudo que escrevemos acontecer, mas não teve grandes impactos na música. Agora o processo de pós foi mais complexo, porque não conseguir estar fisicamente no mesmo espaço para mixar e masterizar o álbum nos deixou com uma sensação de que não estávamos ouvindo direito, cada dispositivo é único o que não nos trazia uma sensação de estarmos ouvindo a mesma coisa. Isso atrasou o processo em 8 meses entre refações e testes.

Rodrigo: Na minha opinião, tem uma coisa de tentarmos ser mais diretes na forma de se comunicar. Tanto na mensagem que estamos enviando quanto na crueza com que tentamos lidar com o nosso contexto político e pá. E acho que isso tem relação com todas as merdas que vem acontecendo e com a forma como estamos tentando lidar com elas. Na parte mais técnica da obra, tem essa situação da gravação e trampos de pós e também na montagem da capa e material visual que foi feito também já em período de pandemia e foi um pouco diferente de como eu acho que seria feito sem distanciamento social.

Patrícia: Acho que não é a toa que procuramos ter bandas, fazer música…uma forma da gente colocar pra fora o que vivemos, observamos, nossos incômodos e revoltas. Tudo isso nos influencia, tanto nas letras quanto na sonoridade. Então sim, os retrocessos e todas essas questões nos influenciaram na composição de Sintoma, e a pandemia atrapalhou o trabalho da pós-produção e da divulgação, mas seguimos nos adaptando e fazendo o possível no momento.

Jiu: Nosso contexto sócio-econômico e político interfere em toda nossa existência, quando Bolsonaro assumiu a presidência muita coisa mudou em nossos corações, em nosso “sossego”, em nossa perspectiva de construir uma sociedade mais próxima da qual acreditamos, sem miséria, sem sofrimento por negligência do governo, etc. Parece que foi como uma avalanche, parece que nossos sonhos diluíram e foi muito denso lidar e lutar com esse sentimento que nos atravessava diariamente. Eu tive períodos de muita insônia, de lá pra cá aliás não consigo parar de ter pesadelos perturbadores. O índice de suicídio, depressão e ansiedade também disparou exponencialmente em nossa sociedade. Tudo isso é reflexo de um desgoverno preparado para adoecer o país. É muito triste constatar como eles são “eficazes” em fazer isso. Mas é importante pontuar que também temos muita resistência em vários lugares e que não vamos abaixar a cabeça e esquecer todos os sonhos e desejos que já tivemos um dia. Então, compor um disco em meio a isso tudo é como uma espécie de verborragia. A gente precisa falar e alcançar pessoas que também precisam, a gente precisa construir nossa resistência. Sintoma é uma denúncia, um pedido de socorro e também um porto seguro. A gente sabe o que está acontecendo, não somos ignorantes e não vamos nos calar.

Vi uma playlist de artistas de referências que vocês criaram. Elza Soares, Kiko Dinucci, Karina Burh, Mercenárias… Influências distintas entre si e ao mesmo tempo que dentro dos seus nichos destoam por experimentar. Quando se mudou da estética mais etérea e passou para mais dançante procuraram essas semelhanças com os artistas citados? Como eles influenciaram o novo disco?

Rodrigo: Lendo a sua pergunta e parando um pouquinho pra responder, me veio meio que a imagem de uma teia de informações, linguagens e formas de lidar com a música onde estão uma porrada de artistas que se conectam, alguns com fios mais grossos e outres com fios mais finos. E acho que, tendo essa “visão”, penso que essas referências já estavam ali de alguma forma, e vou pra além, de pensar que muitas coisas que eu nem conheço e foram referência para as minhas referências chegaram até mim através de uma intenção de expressão de sentimentos, sensações e inquietações que são equivalentes ao que estamos trazendo na nossa música. Nossa, acho que viajei um pouco. Risos.

Cint: Muitos desses artistas eu já ouvia, alguns desde criança/adolescente, outros mais recentemente, mas não como referência para o disco em si. Quando começamos a compor e tínhamos uma ideia do caminho a seguir, a gente foi juntando toda nossa memória musical de uma vida, colidindo estilos diversos, cada um de nós vem de escolas muito distintas entre si. Eu tive banda de punk/hc crossover, Jiu é do role do post rock, Ro e Vinhas são nossos noventeiros e Ro especificamente do shoegaze. Então vem uma saladona de música em nossa formação. a gente falou no começo das composições em algo mais caminho do no-wave, mas a gente é brasileiro, tá ligado? No-wave é coisa de bicho estadunidense e europeu, embora tenhamos algumas representações importantes do estilo no Brasil e que adoremos as bandas de no-wave estadunidenses e europeias, aquilo ainda não era nossa voz. E como é o no-wave brasileiro? Akira S & As Garotas Que Erraram? Black Future? Fellini? Muzak? Voluntários da Pátria? Amo todas essas bandas, mas ainda nelas, sinto pouca ousadia em misturar elementos e se permitir fazer algo fora da caixa. Exceto Black Future que tem varias referências do samba carioca mas ainda é beeeeeeem no detalhe. Então quando a gente percebeu que deveríamos literalmente pirar, a gente se jogou de cabeça e todas essas outras musicalidades que fazem parte da nossa história acabaram sendo refletidas no disco. Sobre os artistas que citamos na outra matéria, todos eles estão refletidos no disco em algum pequeno detalhe, seja o jeito de cantar da Rosalia ex-Mercenárias, seja a mensagem irônica d’Os Mulheres Negras, o Metá Metá, mais especificamente o Kiko, inspiram o Ro de certa forma no jeito de tocar… Dá pra ouvir no nosso disco elemento de tudo que ouvimos. Pensando aqui: acho que o que une esses artistas nas influências é a ousadia mesmo. Todos eles experimentaram de alguma forma, em algum momento. Eu gosto é da ousadia. Risos

Patrícia: A resposta da Cint me contempla, e amei a referência da teia e da ligação que temos com as influências das nossas influências ❤️. Acho que teve tudo isso da pesquisa, da junção de diferentes vivências e referências, mas tem também a intuição, que tem uma intensão em sua base, mas que se dá em um movimento irracional. Eu mesma muitas vezes me deixei levar pelo momento e pelas sonoridades que estavam se apresentando ali no ensaio… Nem tudo que surgia servia, e algumas partes precisavam de mais tempo de exploração para encaixar na proposta…Por isso que digo que o tempo mais a paciência foi fundamental, para que também todo esse processo fosse divertido ao mesmo tempo que um compromisso.

Jiu: Da minha parte acho que quando estou compondo, normalmente paro de ouvir tudo que possa soar meio parecido com o que gosto de tocar. Entro num universo o mais próximo possível do neutro e deixo a coisa acontecer. Gosto de como o resultado se dá principalmente pelo reflexo do corpo, da memória muscular. Ação e reação, estímulo sensorial, enfim… Então durante o processo de composição não consigo pensar em quais artistas estavam na minha cabeça. Hoje, ouvindo o disco a gente consegue apontar semelhanças e todas elas estão mesmo no campo do experimento, da ousadia, da vontade do que é o outro, o diferente, etc. Acho que é mais por aí, pelo que podíamos explorar/investigar/descobrir de nós mesmos e menos do que podíamos soar como os artistas que a gente gosta.

Ruínas, primeiro disco da In Venus. Clique para ouvir.

O Sintoma quando começou a tocar eu parei pra olhar se eram vocês mesmo (risos). Pela diferença sonora. Até uma pegada de samba reggae (em um trecho de “Velocidade Líquida”). Tem o sax também que passeia pelas músicas. Vocês já disseram que passaram bastante tempo juntos. Mas como era o fio condutor das composições? Tinha um riff, uma levada persuasiva e se criava em cima disso?

Patrícia: As vezes alguém trazia algo de casa, seja uma melodia de vocal, uma sonoridade de teclado, um riff de guitarra, ou um batuque de Jiu… Outras vezes a gente fazia jams, e depois via o que tinha saído bom de lá e repetia, e começava a construir algo em cima disso. Também já aconteceu da Cint falar, por exemplo, que queria fazer uma música sobre algo específico, e essa ideia já ser incorporada na composição da música desde o início. A gente grava todas as ideias, pra depois não ficar surtando que teve uma brilhante ideia e esqueceu (risos). Teve música que a gente mudou pouco antes da gravação, porque a gente se permitiu mesmo testar novas formas de tocar mesmo depois de ter definido a música. “Ancestrais” a gente fez dois ensaios antes de gravar e pra mim foi um fechamento fundamental no disco. A gente se permitiu explorar, e isso fez com que surgisse toda uma gama de ideias e sonoridade. Um processo muito intenso e muito bonito. Afff deu saudades. Risos. Outra coisa que norteou a gente foi o fato de consumirmos um bolinho de óleo de cannabis nos ensaios mais longos, e para mim aguçava muito a criatividade, me dava paciência para ficar horas e horas ensaiando, aliviava as dores e tensões, e proporcionava muitas risadas também (risos).

Clint: Complementando a resposta da Patricia, existia uma vontade grande de sair da nossa zona de conforto. A primeira música do disco a ser composta foi “Ninguém se Importa”, ela acabou sendo nossa própria referência em questão de sonoridade. Quando finalizamos ela, entendemos que era nessa linha que gostaríamos de ir. E já existia uma vontade de colocar sax em alguns sons, convidamos o Rafa Nyari e ele topou na hora, escolheu as músicas que gostaria de participar e a gente deixou ele livre pra fazer o que ele queria.

Jiu: Legal que você parou pra dar um check em quem eram esses novos In Venus (risos).
É, cada música apareceu de um jeito, através de jams principalmente ali nos primeiros encontros que precisávamos gastar e encontrar nossos caminhos juntos. Depois também algumas músicas nasceram por um riff, ou uma levada de baixo, ou um tema específico a ser tratado na letra que tendia a determinar o mood sonoro, tivemos músicas que nasceram de uma levada na batera também. Não há um padrão engessado. Inclusive o mais insano é que por vezes estamos cada um tocando uma parada e tudo parece uma grande bagunça sonora e a gente vai se encontrando em alguns lugares, voltando a ouvir o que os outres estão tocando… Mas tem isso também, a gente gosta muito de tocar juntes, porém cada um uma coisa diferente (risos). E depois a gente para e começa a organizar algumas coisas que cada um gostou de si mesme ou de algo que ouviu do outre.

Rodrigo: Pra mim tem algo de me sentir muito provocado pelas novas formas de criar músicas que todes estavam me mostrando e isso fez com que eu tentasse olhar para o modo que estava acostumado em fazer as coisas. Até pensar em como tocar a guitarra de uma outra forma e isso trouxe uma sensação de uma busca de como lidar com o instrumento através da forma que meu corpo se ligava com ele e com isso, entender quais gestos e movimentos o meu corpo sugeria intuitivamente para usar a guitarra, de uma forma mais instintiva e menos pré-projetada do que eu queria que soasse antes de tocar.

As letras como vocês já disseram são bem diretas. Muitas vezes o som “caótico” dá um peso certeiro e aumenta ainda mais o alcance. As letras também tiveram esse modo de composição das melodias? Experimentações?

Clint: O processo de composição das letras foi muito orgânico, tem algumas que eu já tinha ideias esboçadas e eu adaptei pra encaixar na sonoridade, outras eu sentia o caminho da sonoridade pra compor, algumas nós discutimos o tema que gostaríamos de abordar… Mas no geral, rolou bastante pesquisa e investigação pra chegar nas letras, porque além de expressar o que estávamos pensando, nossa música também tem um caráter informativo, então não dava pra simplesmente fazer músicas baseadas na nossa opinião pessoal. Já as melodias de voz, eu escutei muitos artistas e bandas pra chegar onde chegamos, mas também tem muito do meu estilo punk de cantar.

Patrícia: Já que falamos de vocais, vou acrescentar sobre os backing vocals… Foi uma decisão conjunta eu assumir essa parte… Alguns backings eu testava no ensaio mesmo, outros a Cint já vinha com uma ideia. A parte que eu canto em “Ninguém se Importa” eu peguei de uma outra música minha antiga, chamada “Loucura do Mi” da Las Dirces, porque achei que se encaixou muito com a proposta da música e pensei “por que não ressignificar?”. E quando eu trouxe todo mundo abraçou.

Jiu: Acho que essa resposta é mais de Cint, mas também gosto de lembrar o quanto a gente conversava bastante sobre tudo o que estávamos sentindo, desde sentimentos mais particulares até os mais comunitários e de certo Cint encontrava uma forma de sintetizar todas essas conversas e de repente tínhamos uma melodia soando perfeitamente bem em cima dos instrumentais.

Rodrigo: Na minha ideia foi bem o que a Cint respondeu mesmo. Lembro de algumas vezes ficar com algumas frases das músicas, ainda em estado de composição, martelando a minha cabeça por vários dias. Risos.

Semana passada rolou uma discussão sobre o jornalismo musical. Sobre a enxurrada de lançamentos toda semana e a falta de dar vazão a isso. Vocês fizeram algum plano de divulgação do disco focado em sites/blogs específicos? Até sobre o lançamento do vinil…

Cint: Fizemos um plano de divulgação sim. A Flora Miguel e a Iza Costa nos auxiliaram com assessoria de imprensa, mas como rolou essa grande quantidade de lançamentos, já ficamos bem felizes com o “pouco” alcance que tivemos. Também trabalhamos as mídias sociais, eu e Vinhas, com suporte de identidade visual criado pelo Rodrigo e vídeos criados por Jiu. Agora o que melhor divulga um artista/banda são shows, esperamos que nossa participação no Festival Amparo, que está sendo promovido pela prefeitura traga frutos melhores. Nossa melhor divulgação sempre foi em shows, daí na pandemia com tudo suspenso, ficou difícil nos promover.

Rodrigo: A pandemia deu uma brecada em várias camadas de funcionamento do rolê de ter banda né? Como foi citado aí em cima, nós fizemos um trampo de divulgação do disco mas sinto que a forma como as pessoas estão acessando música tem passado por um momento bastante difícil de entender e isso também da uma atrapalhada em como divulgar e comunicar sobre o disco.

Não sou fã das lives. Mas foi a salvação de muita gente. Participaram de alguma e esse show do Festival Amparo será como?

Cint: Também não sou muito fã, mas só de poder assistir bandas amigs ou até artistas que não estão no nosso role já dá um quentinho no coração. O Festival Amparo começou dia 23/07, vai até 01/08 e está apresentando diversos artistas e projetos artísticos de teatro e dança. Essa é a nossa primeira live que contou com uma produção incrível do Carlão do Estúdio Aurora. A gente conversou bastante durante a pandemia sobre fazer lives e achamos melhor não fazer pois Patricia e eu temos comorbidades e não poderíamos nos arriscar, só agora que já estava muito próximo da nossa primeira dose de vacinação que resolvemos abraçar a ideia (Patricia e eu fomos vacinadas dias antes da live ser captada).

Rodrigo: Nossa, eu também não consegui pegar tão bem com as lives, sempre fico com uma sensação de estar faltando algo.

Levando em consideração que a vacinação está avançando, não como queríamos, e a pandemia parece estar melhorando, quais os próximos passos?

Cint: Voltar a tocar (risos). Por enquanto estamos esperando ver o que acontece, mas o que queremos de verdade é palco e público!

Patrícia: Vamos voltar a ensaiar às vezes… Reviver as músicas… Quem sabe mais uma live? Quem sabe vai rolar shows sei lá, ano que vem? Quem sabe compor…. Vamos ver o que o futuro nos aguarda (risos).

Jiu: Ainda acho difícil pensar nos próximos passos. Existem os passos que desejo e os passos que precisamos entender se são seguros de fato. Não sei se a vacinação será o suficiente, temos novas cepas, demoramos muito pra vacinar a população como um todo e é óbvio que isso trará consequências. Ainda é um momento muito triste, né? Ainda temos conhecides morrendo antes da vacina. Não consigo pensar nos próximos passos, ainda.

Rodrigo: Bom, temos algumas horas de ensaio já garantidas no estúdio e precisamos estar todes se sentindo segures para voltar a ensaiar as musicas e disco e ver o que rola quanto a novas ideias e tal. Mas sem atravessar os cuidados que os tempos atuais necessitam. Da minha parte, vou pegar as indicações de leituras e sons que foram citadas aqui pra dar uma atualizada nas nossas interações.

E pra finalizar o que andaram lendo, vendo e ouvindo que acham bacana ser compartilhado. Que tenham gostado ou influenciado a banda.

Cint: Durante a composição do disco, eu fiquei aficionada pela série Years and Years e acho que ela foi uma referência importante sobre as ideias que abordamos. Atualmente estou lendo Gênero, Raça e Classe, da Angela Davis, indico demais!

Patrícia: Tanta coisa que nem sei…. Mas estou brisando bastante em símbolos e sonhos, ontem fiquei vendo o documentário O Poder do Mito, achei fascinante. Eu indico muito ler o capítulo “O simbolismo nas artes plásticas” de Aniela Jaffé, que se encontra no livro O homem e seus símbolos.

Jiu: Ando lendo alguns romances de Ignácio de Loyola Brandão, Milan Kundera, Patti Smith, as peças de Grace Passô. Tenho visto muitos filmes como Construindo Pontes, Entreatos, Jogo de Cena, vários da filmografia do Spike Lee e sempre volto pro meu filme preferido até então que é No coração do Mundo. Discos tenho me agarrado ao álbum novo da Linn da Quebrada, gosto muito de Rincón Sapiência, Tássia Reis, ouço mil vezes por dia o álbum da Luedji Luna – Bom Mesmo é Estar Debaixo D’agua, Cint me apresentou recentemente o álbum de 2017 da banda Corte, eu não conhecia e nossa que presente! Também ouço muito Clube da Esquina. Tenho me encontrado nos ritmos mais “mansos”, mas não só. E tenho trabalhado muito com as edições de pós-produção audiovisual e tenho me deparado com diversos artistas fantásticos e diversos projetos maravilhosos que em breve estarão no ar 🙂 Preciso citar Edgar com o álbum Ultrassom, que disco FODA! Vamos incluir na leitura também o livro de Maggie Nelson, Argonautas, que aborda o tema de gênero fluido. 🙂

Rodrigo: Tem um livro chamado “Torto Arado” que li no começo do ano e tenho indicado pra todo mundo que posso. Além dele, li o primeiro capítulo da “Pedagogia da Autonomia” do Paulo Freire e foi explosão mental e indico demais. De som, vou falar aqui o que vier primeiro na minha cabeça. Tem um maninho do Rio, que o trampo dele se chama Mbé, que é lindo lindo lindo, tenho ouvido Tasha & Tracie, Shanique Marie, Nubya Garcia, Indio da Cuíca. Descobri na pandemia umas coisas que nunca tinha parado pra escutar, como o Milagre dos Peixes do Milton Nascimento com o Naná Vasconcelos e é algo que me faltam palavras pra conseguir descrever, e outras coisas que eu não tinha olhado com muita atenção, como o Gil e Jorge – Ogum Xangô que foi algo que me deu muita força em várias dias ruins desse ano.