Entrevista: Rieg enfim alça voo solo

Por Hugo Morais

Rieg Wasa transita bem por mundos distintos na música. Fez parte de bandas como Star 61 e Madalena Moog, ambas de João Pessoa onde ele vive há quase 20 anos. Rieg é americano e cresceu na Alemanha, traz em suas composições tudo que ouviu e ouve, criando sozinho, em dupla ou com mais pessoas. Participou do projeto #30Dias30Beats e isso inspirou a criar mais durante a pandemia e chegar a um disco conceitual sobre um astronauta perdido em direção a Júpiter. O planeta batiza o disco e a viagem perdida diz muito sobre os dias de hoje. O disco traz momentos de introspecção, outros mais dançantes e também tem espaço para sons viajosos.

Além da produção solo, Rieg faz parte do duo D_M_G, do projeto Orijah e é um dos produtores do BBS Estúdio onde trabalha com diversos artistas paraibanos. Júpiter, que o músico assina como riegulate, é o primeiro lançamento inédito do selo Hominis Canidae Rec.

Batemos um papo com Rieg sobre suas produções e inspirações. Confira o papo e já dê aquele play no disco Júpiter, no player abaixo.

O Inimigo — Rieg, pra começar, a lembrança que tenho da primeira vez que te vi foi da banda homônima no Festival Mundo, acho que em 2018, Usina Energisa. Foi tua primeira banda? Ou teve alguma antes?

Rieg — A banda Rieg existe desde 2010 (e em vários formatos), antes disso já tinha lançado um trabalho solo — bem despretensiosamente — voz/violão/sampler lofi, gravado em casa, gravando o CD-R em casa mesmo e entregando nas lojas de música aqui em João Pessoa. Esse CD meio que deu o start pra banda. Algumas musicas que seriam, sei lá, pro segundo disco solo, terminaram se transformando em versão banda e algumas foram deixadas de lado. Antes disso, tocava guitarra/teclado nas bandas Star 61 e Madalena Moog daqui de João Pessoa. E antes disso tudo, eu tinha uma “jam band” lá na Alemanha, e aí, já que ninguém queria cantar, eu tentava (risos). E já que ninguém queria compor, eu tentava.

Daí esse trabalho solo agora, é um pouco uma continuação desse primeiro álbum solo/folk. Tipo, voltar pra algo despretensioso mas que seja minha expressão/voz. E tipo, com muita psicoterapia —(riso) — entendi que sou uma pessoa meio tímida/introvertida e já que a gente mudou muitas vezes de país, eu aprendi a curtir minha própria “lombra”. Essa coisa da voz/da fala/da língua, sempre é algo que é difícil pra mim, então, essa expressão através da minha arte é importante. Fui observando a diferença entre uma conversa que tava tendo com o meu primo canadense e, sei lá, pessoas brasileiras. Aquele silêncio da pausa pra deixar outra pessoa falar, participar, é bem maior em outros países, são outros ritmos de guiam. (Mas não to reclamando do ritmo daqui).

Então eu vi você a primeira vez tocando na Madalena Moog com Patativa. Tava com isso na cabeça hoje. É engraçado você falar isso de pôr sua pessoalidade na produção porque você já produz, e coisas bem distintas entre si, há muito tempo. Como com Daniel Jesi que é outro cara que faz muita música. Por que só agora voltar a essa individualidade?

Acho que a pandemia meio que isolou a galera de todo jeito né… E você começa a ter muito mais convívio consigo mesmo… Mas na realidade foi um conjunto de coisas… Foi praticamente 10 anos desde o primeiro — (risos), e graças ao projeto #30dias30beats voltei a ter um certo Flow/autoestima pra produzir beats e sons. Precisava mesmo ter isso e retomar essa individualidade. Tipo, a banda Rieg tem o meu nome mas sempre encarei como projeto de banda. Tudo é feito com grupo e cada vez mais a composição toda é feita em conjunto. É uma expressão de grupo, de movimento, e isso é foda. Mas com certeza tem vez que só posso falar por mim mesmo. Se Rieg é a banda, quem é Rieg a pessoa? Precisava buscar isso.

Essas músicas do Júpiter eu acho que resumem bem parte da minha essência musical. São as músicas que vieram mais rápidas, por coincidência tendo essa mesma temática da solidão, do espaço, da viagem. Tem os elementos que gosto de synth, de nostalgia, de rock, do experimentalismo, cenografia. Tem música de 2008/2009 no álbum, tem música de 2014, tem do #30dias30beats do ano passado e de agora, 2020. Então é isso. É um espelho pra mim, e a forma de eu me comunicar, sozinho.

Se expressem. Criem arte, seja bom/ruim/doido lancem sua voz por você mesmo. Se arrisquem. Não tem erro.

Rieg Wasa

Ia perguntar sobre a variedade sonora do disco, mesmo não sendo conhecedor da música eletrônica e você já meio que respondeu. Mas esse disco teve um norte ou você foi compondo/juntando (com as antigas) e viu que tava bom? Tem muita influência eletrônica distinta. E já emendo outra questão: na sua criação viajando e ouvindo/conhecendo sons, o que é mais primário em termos de influência? A escola alemã é muito boa e primordial.

No #30dias30beats eu meio que fiz uma seleção das músicas que eram pra mim sonoramente/tematicamente parecidas. Daí fui também lembrando de músicas antigas nesse estilo e trabalhei mais em todas. As do #30dias30beats aumentei pra serem músicas completas (mais de 1min, risos) e as antigas, estavam paradas e desenvolvi mais. Tem esse lance espacial/cibernético mas porque sou nerd mesmo e curto muito (risos). Eu acho que também dá pra ouvir outras referências do punk anos 80 e música techno/new wave da Alemanha, que fez muito parte da minha adolescência.

Quando cheguei em Berlin era bem no primeiro pico do Love Parade. Massa demais. Na Alemanha essa música new wave e techno é mais comum e predominante, especialmente na época quando morava lá. Mas hoje em dia também curto bastante uns House, especialmente devido ao meu amigo @iordz e o a galera do @housedancepb. O @dmg.wav tocava uma festa mensal no @espacomundo chamada No Repeat e essa primeira experiência como DJ de festa aberta foi muito rica.

Você percebe muito mais essa conexão real com o público, essa temperatura. E realmente, quando o povo dança, é outro nível. A gente não vê isso em show de rock normal, infelizmente. Punk tem pelo menos o pogo, mas como se dança num show de rock normal? Parece que a música eletrônica e a disco music (amo muito também) instigam mais pra isso. Isso é massa demais.

Como está a recepção do disco nas mídias especializadas?

“Especializada”… Dificil (risos). No sentido de que não é um álbum convencional de música eletrônica, eu acho que quem escutou, sacou as referências modernas de Com TruiseDaft Punk e Black Moth Super Rainbow. E eu, enquanto artista solo, não tenho um super público também. Mas como falei, não criei nem expetativa com isso. Todo esse lançamento foi uma super terapia e reflexão. Tipo, inicialmente eu tinha ficado bem mal com a ausência de pessoas próximas nesse lançamento, mas, foi uma expectativa que eu tinha criado que eles não têm obrigação de corresponder, e sei lá o que acontece na vida/psique de cada um, além de que o principal é EU estar satisfeito com o meu trabalho e não buscar aprovação de fora. Isso foi a mensagem que eu queria passar pras pessoas. LANCEM sem medo e sem expetativa. Se expressem. Criem arte, seja bom/ruim/doido lancem sua voz por você mesmo. Se arrisquem. Não tem erro.

É interessante ver uma criação como a sua porque o que mais tem saído são discos sobre a quarentena/pandemia e a obra eletrônica tem um caráter bem subjetivo. De causar uma viagem para vários lugares dentro da cabeça de cada um. Sei que estamos em meio a essa desgraça toda, mas você tem em mente algum planejamento de levar isso a palcos por aí?

Com certeza, quero criar um show em volta disso. Especialmente pra tocar no twitch e etc. Esse lance digital, apesar de ser meio doido — e meio “black mirror” , uma reflexão de si mesmo, querendo ser uma conexão com o outro. Até que no inicio da pandemia consegui desenrolar alguns shows da @riegband na internet, mas esse riegulate queria tentar fazer de alguma outra forma. Mas ainda vou adaptar pra esse formato, já que as músicas tinham caráter total da produção virtual. Mas eu acho bem massa a ideia. Eu curto muito aquele youtuber Marc Rebillet que faz live, meio improvisado com canção e tal.

Então pra finalizar, o que você tem em mente daqui pra frente em suas produções, tendo em vista que não sabemos o dia de amanhã?

Em breve vai rolar um single novo da @riegband que tô bem animado, uma música mais pop com dança incrível de @jairosvaoficial e animação foda do @estudio_407. Deve estar saindo dia 15 de novembro. A banda também está desenvolvendo um jogo pro Android/ios chamado Nomad Soul, meio cyberpunk point and click com ritmo.

Em relação a riegulate to fazendo hoje (25/10) uma colaboração como vj pra @berraboi no @festivalzonamundi e to curtindo esse feedback do Júpiter, mas já pensando nos próximos lançamentos. Tem um álbum semi pronto de beats mais groove, mais urbano, mais sample based hiphop; Tem algumas músicas com colaborações com umas pessoas daqui, meio estilo R&B com synths; E estou pensando no relançamento desse meu primeiro álbum de 2009 com músicas inéditas dessa mesma época. Então vamos ver! Essa parceria com o selo rec do @hominiscanidae foi uma experiência bem incrível, especialmente com todo apoio do @bbsaev — foi muito massa e só me instiga.