A banda pernambucana Diablo Angel lançou seu terceiro álbum, O Que te Dá Prazer. No novo trabalho, Kira Aderne (vocal e guitarra), Nívea Maria (teclado), Tárcio Luna (guitarra) e Vitor Lima (bateria) passeiam pela introspecção sem perder de vista o lado ensolarado. Um disco para curtir em casa sozinho ou até numa praia com amigos, já que tem uma pegada dançante com riffs fortes e letras que levam a reflexão. Um disco que conta com o avô de Kira, Zé Leite, do alto de seus 92 anos.

Batemos um papo com Kira Aderne sobre o novo trabalho e convidamos para que ela fizesse um “faixa a faixa” sobre o disco, que você confere depois do papo.

Hugo Morais: Kira, o disco tem uma pegada introspectiva, um olhar pra dentro. Isso, como ocorreu com muita gente, foi influenciado pela reclusão da pandemia?

Kira Aderne: Em algumas faixas sim, como “Placere”, mas ao mesmo tempo é um disco bem solar, alegre, como em faixas como “Mais Um Dia de Sol”, “The Sun Is Shining On Me”, “A Espera”, etc.

Sim. Faixas dançantes. Com riffs fortes. Como foi o processo de composição do disco?

Foi como sempre acontece, começo sempre sozinha. Mas além da guitarra, usei o sintetizador pra ter outras ambiências no som. Mas o processo meio que resetou quando fomos pro estúdio produzir as músicas com Pedro Diniz. A gente passava um ensaio inteiro numa música só, foi engraçado que Vitor Lima, nosso batera, ficou um pouco impressionado. A gente nunca tinha trabalhado assim, muitas músicas mudaram completamente do que era inicialmente. O que foi ótimo, adorei ver as mudanças e curtir como a banda transformou junto com Pedro cada uma delas.

Trabalhar em mais de uma música geralmente é menos cansativo, não é? Achei muito interessante a sonoridade do disco porque não tenho ouvido muita coisa indie assim. Pessoal está mais com uma pegada oitentista. Um revival. E vocês conseguiram fazer um disco que tem peso, é pop, é dançante. Isso era uma ideia desde o começo ou foi criando forma com os ensaios e participação do Pedro Diniz?

Geralmente sim, mas dessa vez foi diferente. Totalmente, você pegou exatamente o que a gente quis. A ideia era fazer um álbum mais dançante, com beats, elementos eletrônicos. Foi essa pegada sim com Pedro que entrou com essa ideia junto com a gente. Entretanto, no fim não perdemos a nossa identidade com as guitarras. Isso foi uma surpresa até pra gente, apesar de pop, tem bastante elemento rock também. As guitarras foram aparecendo, apesar dos synths, e ficaram na mix final.

Falei antes da introspecção e você completou com o elemento solar do disco. O prazer citado no disco passa por envolvimento, companheirismo e até questionamento. A gente saiu de um período de negacionismo que recai também na negacão da mulher como um todo. Como você tem visto esses novos dias que vivemos? Tem influência nas composições?

Você tem toda razão, vivemos nesses anos um movimento de retrocesso. E algo que aprendo todos os dias, é que não existem direitos garantidos em nenhuma esfera. Temos que sempre estar vigilantes por nossos diretos e lutar para mantê-los ou mesmo ampliá-los sempre que necessário. Uma mulher livre e que fale em ter prazer é algo ainda temido por grande parcela social. Claro que isso é tema dessa disco. Falo dessa mulher livre em sentir, ter experiências e ter prazer.

Kira como esta pra tocar em Recife e arredores? Aqui em Natal apareceram mais lugares depois que a pandemia diminuiu e estão rolando eventos todo fim de semana.

Aqui também está rolando, a gente fez o lançamento no Liamba. Um pico alternativo que sempre bomba. Também começou depois da pandemia e tem se firmado. Dá pra tocar, mas são poucos os lugares com cachê pra música autoral. Depois de 10 anos, a gente tenta escolher bem onde tocar.

Tem isso. E como estão os planos pra frente? Tour? Usar leis de incentivo pra fazer algo?

Estamos aqui essa semana organizando papelada pra prensagem em vinil. Um sonho antigo! Vimos aqui (os editais) do FIG (Festival de Inverno de Garanhuns), São João Caruaru e o lançamento no Liamba.

O Que Te Dá Prazer – Faixa a Faixa, por Kira Aderne

“Placere”

Faixa que abre o disco e também um convite ao ouvinte para entrar. É uma música que fala de prazer, prazer sexual ou qualquer outro tipo de prazer. O nome do disco está nessa música. Esse prazer pode ser encontrado acompanhada ou consigo mesma. O que quer que a gente faça, o prazer está no nosso próprio corpo. Feita durante a pandemia, foi um momento em que todos tentamos buscar esse prazer de alguma forma confinados dentro de apartamentos. Fora do confinamento, a mensagem é a mesma: encontrar “O Que Te Dá Prazer” é fundamental e urgente.

“Mais Um Dia de Sol”

A produção de um disco é algo muito interessante. Tinha muitas dúvidas sobre essa track e no fim foi uma das que mais gostamos. Pedro Diniz, nosso produtor musical, transformou essa música nesse beat maravilhoso que ela tem. É uma faixa bem pra cima, otimista. Fala de renovação, da renovação que um novo dia de sol pode trazer. Mais um dia para renovar as esperanças e acreditar que, mesmo diante das adversidades, duas pessoas no fim podem se encontrar.

“The Sun is Shining On Me”

Essa música foi a última a entrar no disco por ser em inglês. Mas decidi incluir, mesmo sendo em inglês, porque a temática dela tem tudo a ver com o disco. A letras é simples, mas cheia de significado. Fala que quando a gente gosta de alguém, o mundo se aquece. O sol brilha na gente pelo simples fato dessa outra pessoa existir. A sonoridade também segue assim, guitarras solares com a participação de Vini Space, do Mundo Bita. Outro detalhe de produção, foi subir um tom na parte final da música. Toque do nosso produtor, Pedro Diniz, ficou muito gostosa de escutar.

Dois”

É uma das músicas mais indie pop do disco, outra favorita minha. Quisemos dar um efeito bem radiofônico nessa ‘master’ maravilhosa de Leo D. Guitarras quase clean e letra bastante romântica. É a aceitação do amor, de aceitar que realmente se gosta de alguém e esperar ser correspondido. Quem nunca viveu isso? Acho que todos nós.

“Uma Breve História do Tempo”

É uma música de várias camadas, efeitos eletrônicos, como de forma bastante coesa o disco todo traz. Mas nessa música, que é bastante contemplativa e fala de estrelas, de olhar o céu, isso está ainda mais presente. A guitarra slide de Tárcio Luna dá esse molho ‘espacial’. Compus essa letra depois de ler o físico inglês Stephen Hawkins. Entrei nessa viagem de contemplação espacial, mas que também se transforma em algo mais físico quando discuto relação e pergunto “o que há errado entre você e eu?”.

“Quero Que O Mundo Se Importe”

É uma música que também fala de amor, de congelar o momento. Entretanto, acima de tudo, essa música é um chamamento para que as pessoas se importem umas com as outras, com a natureza e com o direito dos animais. “Que as pessoas não sejam assim tão egoístas”. E em termo de comparação, para mim essa música é a minha versão de “Imagine” de John Lennon. Não foi intencional, mas tem essa mesma mensagem: que as pessoas se importem com o mundo ao seu redor. Na sonoridade, apesar de guitarrista, fiz muitas músicas desse disco utilizando sintetizadores. E essa música tem essa atmosfera. Nívea Maria, nossa tecladista e vocalista, engrandeceu com seus belíssimos acordes de teclado.

“Aurora”

É a música mais introspectiva do disco e também uma das belas letras. Ao som apenas de uma guitarra, Aurora é puro romantismo e esperança por um encontro. Uma música bastante etérea. Mas que também ganha um tom filosófico quando se fala que “nesse mundo em que é preciso tentar e sentir”.

“A Espera”

Uma das faixas mais rock do disco, é uma música que faz homenagem a nossa terra, a Pernambuco. Tem esse tom regional. De se sentir acolhido e protegido no lugar onde pertencemos. Grande alegria poder fazer essa homenagem a Pernambuco, a Caruaru, nossa cidade de origem. Mas que também traz um tema cruzado e fala de amor, a espera por esse amor.

“A Vida Chega Mais Tarde”

É uma das faixas experimentais do disco, feita no violão, a quatro mãos, eu e Nívea Maria, é uma faixa bastante especial do disco. É a celebração por concretizar esse sonho, gravar um disco e ter orgulho dele. Ao mesmo tempo, tem esse tom boêmio em dizer que a vida chega mais tarde. Bem tarde da noite é que a magia realmente acontece e nos sentimos felizes. Outra surpresa foi a participação na produção da música do meu avô Zé Leite, natural de São José do Egito, sertão pernambucano, no alto dos seus 92 anos. Ele declama na faixa o cordel de Leandro Gomes de Barros, considerado o primeiro cordelista brasileiro. E São José do Egito é uma terra conhecida por cordelistas e poesia. Cresci escutando meu avô declamar os versos que ele tanto leu na sua juventude. Uma forma bastante especial para terminar o disco.

Uma resposta para “Diablo Angel: Entrevista + Faixa a faixa do álbum O Que Te Dá Prazer”.

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