Trio Gato com Fome passeia pela realidade diária com suingue e irreverência

Foto: Merilyn Esposi

O Trio Gato com Fome é uma desconhecida nesta redação musical. Uma grata novidade entre tanto rock que ouvimos. E de novato o trio não tem nada, são 15 anos de atividades com três discos lançados e shows com nomes como Jair Rodrigues, Moacyr Luz, Alcione, Wilson Moreira, Osvaldinho da Cuica, Riachão ( fizeram parte da banda do músico durante anos) entre outros.

O samba do Trio Gato com Fome é marcado pela não linearidade. Exploram samba de breque, samba sincopado, samba-boogie, tudo com presença forte de percussão e metais ao lado dos vocais. O violão e cavaquinho estão presentes em tudo, mas de fato percussão e metaleira são os destaques.

Capa de Sedento, do Trio Gato com Fome. Arte de Danilo Oliveira.

A capa do disco com o gato em um meio que não é muito do seu gosto mostra que o felino, assim como o trio, seguem em busca do que procuram, lutando contra as adversidades. E os gatos são mestres em conseguir o que querem. Essa gana leva a temas no disco como amor, futebol, quadrinhos, a força do trabalhador, as agruras diárias que vivemos, mas acima de tudo a força de seguir em frente e vencer. Seja lá qual for a dificuldade. E o samba é o estilo perfeito para falar ao mesmo tempo da derrota e da vitória, da tristeza e da alegria.

“Numa Certa Madrugada”, que abre o disco, subverte ditados populares, muda seus sentidos, é a cara dos dias atuais. A instrumentação já mostra que a banda não brinca em serviço com a mistura certeira da percussão com metaleira e o vocal com direito a coral. “Responderei Sambando”, uma ode de amor ao samba, mostra que se há um modo a se escolher para morrer que seja sambando. “Minha Vez no Festival” exalta os festivais competitivos de música, que a banda já participou, e conta as peripécias do personagem para chegar a uma final de festival e ser campeão. Com direito a visita a guia espiritual, Dorival, um pai de santo oriental. “Veneno de Tocandira”, uma das melhores músicas do disco, exalta o trabalho quase desconhecido do homem comum. A música une o baixo acústico com um toque percussivo rural. A Tocandira é uma formiga que tem uma picada bastante dolorosa e é usada em rituais indígenas. O homem comum pode ser, e estamos precisando que seja, uma formiga Tocandira se necessário.

Em meio a temas sérios e outros irreverentes, o Trio Gato com Fome faz um belo passeio pela vida brasileira. Seja através da arte, do futebol, do amor, da morte e até do tempo. “Tempo” ganha o destaque necessário, mostrando o que muitos já sabem: a felicidade anda de mãos dadas com a vivência de saber aproveitar o tempo. “Trabalhar para viver e não viver para trabalhar”. A música é uma simplificação do disco como um todo, e a frase acima resume uma vida. Ou a vida. Para encerrar ainda se tem a música que batiza o disco e mostra o personagem Gato com Fome na luta contra a entrega da água do maior aquífero de água do mundo aos árabes, japoneses e americanos. O samba passeia por influências como Demônios da Garoa, quadrinhos, cinema, e filmes de ação onde a capoeira, jiu jitsu e cachaça são as armas do Gato contra os invasores. A nacionalidade dos invasores é pontuada por mudanças na sonoridade da música mostrando a versatilidade da banda que é percebida por todo o disco.

Além do trio Cadu Ribeiro (pandeiro, percussão e voz), Gregory Andreas (cavaquinho e voz) e Renato Enoki (violão, violão 7 cordas, baixo acústico e voz) o disco conta com muitas participações para se criar todo o clima necessário: Osvaldinho da Cuíca e André Piruka (cuíca), Julio Cesar (percussão), Rafael Y Castro (bateria e percussão), Alfredo Castro (repique de anel), Paulinho Timor (reco reco e garrafas), Alexandre Ribeiro (clarinete e clarone), Allan Abbadia, Conrado Bruno e Luiz Cassio (trombone), Vitor Eiji (sax alto), Enrique Menezes (flauta), Natan Oliveira (trompete), João Poleto (sax tenor), Adriana Lombardi (violoncelos), Wanessa Dourado (violinos), Marcos Alma (piano e rhodes) e o coral Juliana Amaral, Flora Poppovic, Paula Sanches, Anná, Fernando Szegeri, Edinho Silva e Alfredo Castro.

Ouça abaixo Sedento via Youtube.