Em meio a alguns discos, quase 10, ouvidos em dois dias eis que o de Luana Carvalho se destacou. Logo um disco dedicado ao Funk Melódico. Logo, porque não sou afeito ao estilo. Mas caiu bem. E aí a inevitável busca no Google esbarrou em “filha de Beth Carvalho”. Pesado.
Luana lançou em 2017 o duplo Sul / Branco com sambas que às vezes passeiam até por batidas que remetem a cirandas. A voz suave casa com os sambas lentos e trazem alento. O parceiro de projetos é o músico e produtor Kassin, que tem colaboração e parceria com uma infinidade de artistas que vão de Caetano Veloso a Frank Jorge, passando por Los Hermanos. E nem sempre a coisa vai bem. Em Segue o Baile a parceria deu certo. Kassin tem um conhecimento reconhecido do samba e da desconstrução do mesmo inserindo elementos eletrônicos e pops.
Em 2020, em meio a pandemia, Luana lançou o disco Baile de Máscara com versões que homenageiam a mãe com músicas do seu repertório. Músicas envoltas no sentimento do carnaval, mas com a desconstrução citada acima pelas mãos de Kassin. Meu Escudo (Décio Carvalho/Noca da Portela) é umas das seis músicas do disco e, atemporal, fala em usar o coração como escudo.

Segue o Baile referencia o disco anterior e seguindo em frente sai do samba e vai para o funk melódico com cinco versões de clássicos. Inclusive alguns bem recentes, como “Hoje” que abre o disco. Mais uma vez vale lembrar a desconstrução pelas mãos de Kassin (prometo não repetir). Isso possivelmente foi o que chamou a minha atenção, já que assim que a música começou a tocar a identifiquei, mas sem ligar a música a Ludmilla. A música fez sucesso integrando o primeiro disco de Ludmila, em 2014, que também se chama Hoje. A lembrança era de não gostar dela. Pois bem, caiu certeira. “Rap do Solitário” volta quase 20 anos, fez sucesso em 1995 na voz de MC Marcinho. O batidão mantém a linha melódica original, mas com um baixo acústico de fundo dando uma cara mais indie à música.
A maior parte do disco é composta por versões de clássicos do passado, mas Luana também lança inéditas como a certeira “Selfie”, calcada no preconceito em várias esferas da sociedade e explicitadas durante a pandemia, ou seja, atual. “Mainha” é autoexplicativa e com pegada de tambores, a ancestralidade, mistura o eletrônico e o tradicional. Uma homenagem a mãe, sua obra e legado, inclusive com citação ao Grêmio Recreativo Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira. “Teta sem Treta” e “Oração” também são autorais. A primeira, parceria com Andreia Horta, surgiu sobre um papo de câncer de mama. Já a segunda, de letra longa e intrincada, passeia por vários cenários sociais, onde destaco o trecho “a lágrima de um justo vale uma tonelada”, que resume quase toda a letra e a situação de milhares pelo Brasil afora. A oração tem que ser muito forte para defenestrar um cristão que tem como princípio a mentira, a violência e a morte.
Finda que as duas músicas fogem ao que se propõem as versões de funk melódico, mas que dão o tom da versatilidade de Luana. Se você é dos que não gostam de versões, ou tem um apreço pelo som original de músicas como “Me Leva”, de Latino, ou “Garota Nota 100”, também de MC Marcinho, passe longe do disco. Inclusive Mauro Ferreira detonou o disco lá no G1 exatamente pela – lá vamos nós de novo – desconstrução das músicas originais. Escreveu que tirou o viço das músicas. Bem, creio eu, que era a intenção. Agora se desbravar novos caminhos for a sua, vá na fé que vai agradar.