Por Hugo Morais
A última passagem pelo Coquetel Molotov rendeu uma situação inusitada. Parado entre os palcos AESO e Velvet, fui abordado por um garoto de 17 anos.
Para entrar no festival, teve que insistir com a produção (palavras dele) porque faria 18 no dia seguinte, ou seja, algumas horas adiante. Ele conseguiu.
Leonardo Acioli é de Maceió e me abordou com um discurso redondo e forte. Foi de Maceió para Recife vender seu disco, o EP Batata Boy com seis faixas, feito todo em casa por ele ao lado dos amigos Bruno, Thiago, Edu, Lzu e Marvin. Ele também queria ver O Terno e Arnaldo Baptista. Manuseei o disco e voltei alguns anos no tempo quando percebi que o CD não tinha arte: era um CD gravável comum apenas com os nome escritos à caneta do selo (Batata Records) e nome do EP (Batata Boy). Na capa uma foto dele andando de skate ainda criança e na contra-capa outra foto, desta vez no carro e os nomes das seis músicas acima. Perguntei do que se tratava o disco e a sonoridade. Ele apenas disse que eu escutasse e em um momento calmo, relaxado, que eu iria gostar. Pela abordagem, comprei.
Leonardo reclamou que as vendas não estavam boas. Nisso, avisto Jarmeson de LIma, cabeça do Molotov — ao lado de Ana Garcia — em direção ao palco principal. Digo a Leonardo pra entregar um exemplar a ele. Leonardo diz que quer vender. Insisto para dar um disco. Ele diz que se for comprado a pessoa tem mais chances de escutar. Concordo, mas nem sempre acontece.
Leonardo abriu os braços e apontou ao redor. Perguntou o que eu achava do Molotov. Eu disse que gostava, já tinha ido outras vezes, a estrutura é boa, as bandas, idem. Ele disse que aquilo era uma palhaçada. Perguntei por quê. Ele disse que as pessoas não estavam ali pela música. Vestido de calça e camiseta simples, ele destoava de boa parte do público em meio ao “desfile de moda e tendências”. Ainda completou que a juventude estava perdida, que ele tinha que fazer algo a respeito. Disse que os jovens deveriam ouvir João Gilberto e Moreno Veloso. Deu mais vontade de ouvir o disco. Perguntei se ele conhecia Domenico Lancellotti, que lançou recentemente Serra dos Órgãos e formou o trio Kassin +2 ao lado de Moreno Veloso e Kassin. Ele disse que não conhecia. Indiquei para ele ouvir. Acho que vai gostar.
Batata Boy está completo no Youtube e ele disse que se arrepende. Creio que ele pensou depois que deveria soltar após vender uma boa quantidade de cópias. Foi lançado em 25 de abril e uma semana antes ele soltou o single “Tranquilo, feliz”. O som aponta para um lado introspectivo. O fundo eletrônico faz base para violão e teclado em meio a letras sobre sensações e sentimentos do dia a dia. Produção simples e que aponta para um futuro promissor. O problema talvez seja a pretensão e a contradição que permeia a cabeça de Leonardo, totalmente normal pela idade que tem.
Questionei se, já que o ambiente do festival era uma palhaçada, onde ele pensava em apresentar seu disco. Ele disse que em um teatro. Confrontado se não tocaria em um festival, respondeu que sim. Disse que para o começo seria uma boa para divulgar o trabalho. Até a cordinha que mantinha meu copo amarrado à bolsa ele disse que era uma palhaçada. (risos) Além de querer ver os shows de Arnaldo Baptista e O Terno, disse que estava com vontade de jogar um disco para o Tim Bernardes, que lançou recentemente Recomeçar, álbum que não é de fácil audição.
Leonardo saiu dizendo que tinha que comer e que tinha que ser algo em conta. Lamentei o fato do “em conta”, mas opções para comer tinham muitas.